Sentada ao banco de réus do Tribunal do Júri de Campo Grande na manhã desta sexta-feira (9), Karolina Camargo da Silva, de 38 anos, acusada de matar o padrasto Salomão Raimundo de Souza, de 65 anos, a facadas em setembro de 2023, negou a qualificadora de motivo torpe. Em relato, disse que o idoso abusava dela e da filha dela, de apenas 3 anos.
A ré é julgada por homicídio qualificado por motivo torpe e também por recurso que dificultou a defesa da vítima. A denúncia do MPMS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul) aponta que Salomão foi morto ao sair do banho, porque não entregou para ela chaves de uma porteira que dá acesso aos imóveis do fundo, que estava trancada. Por isso as qualificadoras.
Karolina, no entanto, nega que a motivação tenha sido “a porteira”. Ao Tribunal do Júri, relatou que era abusada por Salomão há pelo menos dois anos. A ré morava com o marido na casa ao lado do imóvel onde a vítima residia com a mãe de Karolina – que era esposa dele – e também com a filha da vítima, de 3 anos.
Conforme relato dela, foi o próprio Salomão quem convidou a família para morar ali e, por dificuldades financeiras, aceitou. “No começo, quando eu cheguei, ele me respeitava, tanto que ele não suportava meu marido. Depois de um tempo ele chamou a gente para lá e passou a gostar dele”, explica.
Os abusos começaram verbalmente, conforme a ré. “Me chamava de gostosa, falava que eu estava linda. Ele sempre me elogiava e, depois, sempre passava a mão em mim”, afirma. O padrasto passou a ajudá-la financeiramente também, com alimentos e produtos de higiene para casa. “Acho que ele achou que era meu dono, começou a passar a mão em mim, apertava meu peito, eu falava para ele me respeitar”, explica.
Após um tempo, os abusos evoluíram para sexuais. Karolina explica que os aguentou porque estava endividada com agiotas, também porque a mãe dela adoeceu devido à agressividade de Salomão. “Ela ficou doente desde que ele amarrou o cachorro e ameaçou matar. Eu acordei cedo com minha mãe gritando por socorro e ele bateu no cachorro até a morte, foi aí que vi que não poderia sair de lá”.
Ainda, contou que era ameaçada pelo padrasto, que também usava do estado de saúde da mãe dela para coagi-la. “Ele dizia que era fácil sumir com meu marido e que minha mãe estava com o ‘pé na cova’. Toda vez que ele tocava no meu corpo, ficava comigo, eu ia para o banheiro chorando”.
Era a ré quem ajudava a mãe e aplicava insulina nela. “Cedi por conta das ameaças que ele fazia. Minha mãe estava muito doente, eu não tinha como sair dali, mas não concordava com isso”, relata.
Um dia antes do crime, a filha de Karolina, que morava com Salomão e com a avó, relatou para a mãe que o idoso tinha tocado as partes íntimas dela. Essa foi a gota da água para a ré, que iria dar um basta na situação e, finalmente, ir embora da casa do padrasto.
Passou o dia irritado
No dia do crime, Karolina avisou ao padrasto que iria embora. Segundo relato dela, Salomão passou o dia irritado com a situação. Durante a noite, a mãe da ré pediu para ela pegar algumas galinhas no fundo da residência. A vítima foi para ajudar a mãe, contudo, a porteira que dava acesso ao local onde os animais ficavam estava trancada.
Karolina conta que ficou brava e foi até a casa para pegar as chaves para abrir a porteira, mas ele rebateu: “Por quê? Vai passar um caminhão”. Conforme relato dela, disse que ele nunca mais iria passar a mão nela, então, ele ficou furioso.
A ré saiu do banheiro e tentou levar a filha dela embora da casa, mas foi impedida pela avó da criança. “Eu falei ‘mãe, sai da minha frente’, mas ele já veio de toalha parecendo um louco, gritando e me xingando”. O marido de Caroline pediu para ele ficar calmo, mas Salomão teria entrado em vias de fato com o genro.
“Nessa hora eu pensei nas tantas vezes que ele tinha me ameaçado e corri para dentro. Ele largou meu marido e foi atrás de mim”, relata. Por medo de matá-la, foi até a cozinha e pegou a faca. Então, desferiu os golpes nele.
Em depoimento à Polícia, a mãe da autora disse que desconhecia os estupros cometidos pelo marido contra a filha, e o marido da autora disse ter visto uma primeira discussão entre a esposa e Salomão.
Perdeu o bebê
Na época do crime, Karolina estava grávida de três meses. Salomão, inclusive, dizia que era pai da criança. “Ele beijava minha barriga dizendo que era o pai e eu falava que ele estava louco e era para parar com isso”.
Após matar o padrasto, a enteada ficou no local do crime e pediu para a Polícia ser acionada porque “não queria essa situação”. Ela foi presa em flagrante e levada para o presídio ainda grávida.
Contudo, conta que sentia dores fortes na barriga, mas foi ignorada na cadeia. “Eu perdi meu filho no banheiro, caiu dentro do vaso”, disse aos prantos. Foi somente após o aborto que recebeu atendimento médico para expelir a placenta, que já estava no útero.
*Com informações do Midiamax